Tratar de doenças que exigem acompanhamento constante e de deficiências físicas ou mentais é uma tarefa muitas vezes desgastante. Nem por isso, porém, as idas regulares ao dentista podem ser preteridas. Ao contrário: quem sofre de doenças como diabetes, hemofilia ou hepatite C e outros com necessidades especiais devem receber atenção redobrada para a saúde da boca. Como o organismo é mais vulnerável, uma inflamação na gengiva e até uma simples cárie podem se transformar em focos de infecção, por exemplo, ou provocar dores e desconfortos que pioram o quadro geral do paciente.
Existem cirurgiões-dentistas especializados nesse tipo de atendimento, que exige uma formação diferenciada e, muitas vezes, uma boa dose de paciência. Esses profissionais estudam as doenças de seus pacientes para entender suas necessidades específicas e, em casos de deficiência mental, precisam criar métodos para familiarizar a pessoa com o consultório e os equipamentos dentários. “Às vezes, demoramos dois, três meses para conseguir fazer com que o paciente se sente na cadeira”, afirma o dentista Roberto Elias, que, semanalmente, atende cerca de 40 pessoas com necessidades especiais no ambulatório da Universidade Veiga de Almeida (UVA), no Rio de Janeiro.
Muitos desses pacientes especiais não têm controle sobre o corpo. Se eles ficam assustados ou tensos, os movimentos involuntários tendem a se intensificar. “Muitas vezes essas reações são provocadas pelo brilho da luz sobre a cadeira, pelos aparelhos e pelo som do ambiente”, explica Marcelo Furia Cesar, coordenador da odontologia da AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente). Em alguns casos, os dentistas precisam utilizar sedativos ou mesmo anestesia geral.
Quanto maior o grau de dependência do paciente, mais atenção o cuidador deve ter à higienização e aos cuidados preventivos. “Recomendamos aos pacientes, familiares e acompanhantes que retornem de três em três meses e realizem o auto-exame regularmente”, afirma Cesar.
Em algumas situações, até a escovação diária é difícil. Muitos portadores de paralisia cerebral, por exemplo, têm problemas respiratórios e na arcada dentária, que, somados a uma alimentação pastosa e rica em carboidratos, aumentam os riscos de cárie e gengivite. “Mas a arcada dentária e as vias respiratórias comprometidas dificultam tanto a limpeza como o tratamento”, diz Cesar.
Anemia
No caso dos idosos, os problemas odontológicos refletem-se até no apetite. “Se existe algo incomodando na boca ou causando dor, a primeira reação deles é parar de comer”, afirma a cirurgiã-dentista Ellen Bonini, que trabalha com odontologia geriátrica há 12 anos. Alimentando-se mal, os idosos podem ficar anêmicos, o que compromete a saúde geral.
A consulta geralmente é mais rápida. O ideal é que dure apenas 30 minutos. “O profissional tem de ser ágil durante o procedimento, porque o paciente pode se cansar ou ficar nervoso”, explica Bonini. Há sete anos, ela atende em domicílio pacientes com dificuldade de locomoção e adaptação. “Muitas vezes, coloco a cabeça deles no meu colo”, diz ela, que leva todo o equipamento necessário em uma maleta que pesa 15 kg.
Pessoas mais suscetíveis a infecções e hemorragias, como transplantados, hemofílicos e portadores de HIV (vírus causador da Aids), também devem procurar cirurgiões-dentistas especializados e fazer o auto-exame cuidadosamente.
Há 17 anos, a dentista Márcia Romañach trabalha com soropositivos no Rio de Janeiro. Todos os tratamentos feitos no Instituto Mário Romañach são gratuitos. Mantida por ela e seu marido, Rubens Raimundo Veiga, que é coordenador de odontologia da UVA, a clínica é bastante rigorosa com os detritos que produz. O lixo não é misturado ao do prédio onde o instituto está localizado, e o conteúdo da cuspideira recebe jatos de água sanitária e é filtrado duas vezes antes de escoar pelo ralo para evitar refluxo de material contaminado.
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