A doença celíaca é a intolerância permanente ao glúten – substância encontrada em alimentos como trigo, centeio, aveia e cevada. Uma doença comum. Sua prevalência pode chegar a 1% da população mundial.
O primeiro estudo realizado em bancos de sangue no Brasil e na América Latina, em 1999, indicou prevalência de um celíaco para cada 681 brasileiros.
Em 2000, outra pesquisa, coordenada pela mesma autora, Eleonora Gandolfi, mas com metodologia diferente e desenvolvida dentro de um hospital (Universitário de Brasília – com 1686 crianças e adolescentes), identificou a ocorrência de um celíaco para cada 281 pacientes. Apesar das diferenças, os dois estudos denotam que a prevalência da doença merece atenção.
Essas informações integram a dissertação de mestrado “Prevalência da hipoplasia de esmalte dental em pacientes celíacos”, defendida hoje, 5 de setembro, pela cirurgiã-dentista Luciana Quintão Foscolo Melo, dentro do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da Faculdade de Medicina da UFMG (Saúde da Criança e do Adolescente).
Luciana Melo explica que a hipoplasia dental, um defeito na formação dos dentes que resulta no aparecimento de manchas no esmalte, além de comprometer a estética também aumenta a vulnerabilidade a cáries.
Mas a novidade de sua pesquisa é apresentar a má formação também como um sinal que, se devidamente avaliado pelos dentistas, pode ajudar os médicos a diagnosticar mais cedo esses pacientes.
A conseqüência desse intercâmbio é que, uma vez deixando de ingerir o glúten, desaparecem todos os sintomas. Os mais freqüentes são o atraso do crescimento e, em adolescentes, puberdade retardada.
Mas, de uma vasta lista pode-se também destacar , com variações individuais, em geral, sintoma gastrintestinal variando em tipo e intensidade (como diarréia, excesso de gases, soluços constantes, cólicas e vômitos), perda de peso, perda de musculatura, e, na maioria das vezes, falta de apetite.
Uma dificuldade para a troca de informação entre os profissionais é, na avaliação da autora, que muitos dentistas desconhecem a doença celíaca. Para isso, ela propõe que o remédio seja a ampla difusão da informação científica a respeito.
Outra postura que defende é que o dentista contemporâneo, além de tratar os dentes, deve estar apto a contribuir com a medicina na promoção da saúde da população, de forma mais ampla que no passado. O médico, por sua vez, também pode se valer do sinal dental como auxiliar na investigação que leve ao diagnóstico.
Embora seja comum, a doença celíaca é subdiagnosticada. O diretor da Faculdade de Medicina, professor Francisco Penna, gastroenterologista pediátrico e orientador da pesquisa, ensina que ela se apresenta de diferentes maneiras.
O paciente pode sofrer de anemia ou ter apenas baixa estatura, por exemplo, mas essas manifestações podem ter outras causas. “Quando a doença se manifesta da forma clássica, com diarréia, desnutrição e irritabilidade, dentre outros sinais, o diagnóstico fica mais fácil”, afirma.
Segundo o orientador, “a pesquisa traz mais um caminho. Um novo dado para prosseguir na investigação diagnóstica da doença celíaca”. Ele destaca ainda a importância da interdisciplinaridade para a devida promoção da Saúde e cita o Programa de Pós-Graduação em Saúde da Criança e do Adolescente da Faculdade de Medicina da UFMG, que atualmente recebe profissionais de várias áreas.
OS RESULTADOS
A pesquisa mostra que a hipoplasia dental é mais freqüente entre pessoas com intolerância ao glúten, embora possa ser provocada por outras doenças, como diabetes, asma e bronquite, ou até mesmo por traumas.
Foram avaliados 66 crianças e jovens, com idade de 7 a 23 anos, entre pacientes do Ambulatório de Gastroenterologia Pediátrica do Hospital das Clínicas da UFMG e cadastrados na Associação dos Celíacos do Brasil, seção Minas Gerais. 34 eram celíacos e 32 não tinham a doença.
A porcentagem de celíacos com hipoplasia dental foi de 88,2%, enquanto no grupo de pacientes não-celíacos o porcentual atingiu 28,6%. De acordo com o estudo, as chances de um paciente celíaco desenvolver a hipoplasia dentária são 12,5 vezes maiores, se comparadas à incidência entre os não-celíacos.
A DOENÇA CELÍACA
O principal sintoma da doença celíaca é a diarréia crônica. A ingestão de glúten provoca inflamação no intestino delgado, que passa a apresentar falhas na absorção dos nutrientes. Uma das conseqüências é a desnutrição e o desenvolvimento de anemia resistente ao tratamento com ferro.
Descrita como patologia predominantemente de raça branca e de caráter genético-imunológico, há relatos de sua incidência em indivíduos mulatos e negros. Atinge pessoas de todas as idades, mas principalmente crianças, sendo mais freqüente nas mulheres do que nos homens.
Além disso, os celíacos podem apresentar déficit no crescimento, atraso menstrual, esterilidade e aftas recorrentes. Como a simples interrupção da ingestão de glúten faz desaparecer os sintomas, o diagnóstico precoce é tão importante.
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